A exportação de aços brasileiros semiacabados não sofrerá a sobretaxa que o governo norte-americano tinha ameaçado impor, mas deverá se submeter a cotas restritivas
Por Ricardo Torrico
Desde a última década do século passado, a globalização tem sido propalada como uma panaceia para as empresas e economias nacionais que, ao aderirem, teriam condições de acessar todo e qualquer mercado, desde que, obviamente, fossem minimamente competitivos para enfrentar esse desafio. Berço do capitalismo moderno, os Estados Unidos lideraram a disseminação dessa proposta, que foi aceita praticamente sem resistência pelos países com capacidade de colocar seus produtos nesse imenso mercado. Mas bastou uma brusca e inesperada mudança de 180 graus na política interna dos Estados Unidos para jogar uma pá de cal nesse processo e trazer de volta a velha prática do protecionismo.
É dentro desse novo contexto que se situa a decisão do presidente estadunidense, Donald Trump, de reformular as regras do jogo a seu bel prazer. Umas de suas iniciativas, anunciada no início de março deste ano, foi a imposição de sobretaxas à importação de aço e alumínio da Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, Coreia do Sul, México e União Europeia – ou seja, todos os grandes exportadores desses insumos ao mercado norte-americano. Para justificar a medida, Donald Trump retirou do fundo da gaveta a Lei de Expansão Comercial, um dispositivo datado de 1962, cuja seção 232 se refere a “ações comerciais para proteger a segurança nacional dos EUA” – nada mais do que uma forma de dar um verniz legal a uma medida descaradamente protecionista.
Sobretaxas e cotas
Colocada em números, a ameaça de sobretaxas – de 25% para o aço e de 10% para o alumínio – acabaria inibindo as exportações das usinas brasileira, que no ano passado atingiram 4,8 milhões de toneladas a esse mercado, sendo 3,7 milhões de produtos semiacabados, ou seja, placas, lingotes, blocos e tarugos, para serem processados em solo norte-americano. No dia 30 de abril, faltando algumas horas para a entrada em vigência do decreto de Trump, o prazo foi adiado até 1º de junho. Supõe-se que, durante o mês de maio o governo dos Estados Unidos tenha reavaliado caso a caso e, no dia 31 de maio, anunciou que as sobretaxas seriam aplicadas somente às importações da Canadá, México e União Europeia, Canadá e México, e que os outros quatro – Austrália, Argentina, Brasil e Coreia do Sul – ficariam isentos, mas submetidos a um regime de cotas que, no caso do aço brasileiro, seria a média dos volumes exportados nos últimos três anos.
Em 2017, as usinas brasileiras exportaram aço no valor de 2,5 bilhões de dólares aos EUA, mas, com a limitação imposta pelo governo estadunidense, o Instituto Aço Brasil (IABr) estima que ocorrerá uma queda de 7,4% nas exportações de semiacabados, que representam cerca de 80% do total exportados a esse mercado. Como não se tratou de uma negociação, mas de uma imposição, não restou ao governo e às siderúrgicas brasileiras outra saída senão aceitar essa redução, já que a alternativa seria a inclusão do Brasil na outra lista, dos países sobretaxados.
No que se refere à exportação de alumínio, que seria submetida a uma sobretaxa de 10%, ou seja, menor do que a dos aços semiacabados, o governo norte-americano estendeu o prazo das negociações, existindo a possibilidade de se escolher estra essas sobretaxa e uma cota de 41 mil toneladas anuais, calculada pela média dos últimos cinco anos, mas abaixo do volume exportado em 2017, que foi de 50 mil toneladas. Se as negociações não resultarem em um volume maior, considera-se a possibilidade de escolher a sobretaxa, considerada “menos ruim” pela Associação Brasileira do Alumínio (Abal).
A lição a ser extraída deste imbróglio criado pelo governo de Donald Trump é que o livre mercado – ou globalização – é uma “grande ideia”, desde que, para os Estados Unidos, isso signifique exportar o máximo e importar o mínimo possível.