Agora que o Brasil já sabe quem o governará nos próximos quatro anos, só falta saber quais são as soluções do novo governo para a recessão econômica que assola o país há quatro anos
Por Ricardo Torrico
Nunca antes na história deste país’ se viu uma eleição tão polarizada, polêmica e tumultuada. O processo eleitoral deste ano de 2018 surpreendeu não só os brasileiros como a opinião pública internacional, que olha com especial interesse o que ocorre no país que tem a quinta superfície e população mundial, e que costuma ser qualificado como “o gigante da América Latina”. Esse processo, que culminou no dia 28 de outubro com a eleição de Jair Messias Bolsonaro para a Presidência da República, foi marcado por um inusitado conflito ideológico que desenterrou alguns mitos que se supunha que já tivessem ficado obsoletos, como o medo do comunismo, de um lado, e da ditadura, do outro.
Agora, porém, com os palanques já desmontados, cabe deixar os discursos de lado e enfrentar a vida como ela é, combatendo os verdadeiros ‘monstros’ que assombram o país, que nada têm a ver com ideologias, mas têm tudo a ver com a economia, como o déficit fiscal, a falta de investimentos, a estagnação e o desemprego, que persistem há quatro anos. Definida a situação política, nota-se claramente o alívio do empresariado com a vitória do candidato ‘mais favorável ao mercado’, o que deve permitir a volta da confiança e, consequentemente, a disposição em voltar a investir. Por outro lado, porém, ainda prevalece a incerteza sobre quais serão as medidas efetivas para que as promessas de campanha se tornem realidade. Desafios não faltam ao presidente eleito, sendo o mais imediato e emblemático a tão propalada reforma da Previdência.
Enquanto o presidente eleito não toma posse, os principais setores da economia buscam se adequar à nova realidade política do país, delineando suas potencialidades e equacionando as possíveis soluções para os problemas que têm inibido seu crescimento nos últimos quatro anos. Antevendo nas pesquisas a grande possibilidade de Bolsonaro ser eleito − como de fato acabou acontecendo−, diretores das principais entidades representativas do setor industrial se reuniram no dia 22 de outubro com o ainda candidato para lhe entregar um documento denominado Cartilha aos Presidenciáveis, que resume as premissas consideradas imprescindíveis para a retomada do desenvolvimento. “Para gerar emprego e renda, o Brasil precisa retomar o crescimento econômico. E, como concordam dez em dez economistas, o investimento de hoje é o crescimento de amanhã. Impostos menores sobre o sistema produtivo, um sistema tributário simples, juros compatíveis com o retorno das indústrias e um câmbio que garanta a competitividade dos produtos brasileiros são essenciais para a retomada dos investimentos e do crescimento econômico. É disto que o Brasil precisa!”, diz o documento, que também faz críticas à proposta de abertura da economia da forma como vem sendo elaborada pelos assessores de Bolsonaro.
Se as sugestões ou reivindicações da indústria nacional vão ser plena ou parcialmente atendidas pelo candidato eleito, isso é algo que só o tempo dirá. Por enquanto, os principais setores industrias − entre eles, os grandes demandantes de aço − vivenciam um clima de prudente otimismo, como pode ser visto pelos levantamentos feitos pelas entidades que os representam.
Recuperação do mercado automotivo
No início de outubro, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) divulgou os resultados positivos da indústria automobilística. Nos dez primeiros meses deste ano, o licenciamento de veículos novos totalizou 2,10 milhões de unidades, volume 15,3% superior aos 1,82 milhão no mesmo período do ano passado. Somente em outubro, 254,7 mil unidades foram comercializadas, o que representa um crescimento de 19,4% sobre as 213,3 mil unidades vendidas no mês anterior e de 25,6% em comparação com as 202,9 mil vendidas em outubro de 2017. Para o presidente da Anfavea, Antonio Megale, o balanço mostra uma sólida recuperação do setor em 2018: “O número de vendas nos surpreendeu com uma média diária de mais de 11,5 mil unidades, o que garante a recuperação da indústria automotiva este ano em relação ao ano passado. Certamente fecharemos o ano com resultado bastante positivo e animador tanto para os fabricantes quanto para a cadeia como um todo.”
Em outubro foram produzidos 263,3 mil veículos, o que representou um aumento de 17,8% sobre os 223,4 mil produzidos em setembro e de 5,2% em relação aos 250,2 mil de outubro de 2017. O acumulado nos dez primeiros meses deste ano aponta um aumento de 9,9 %, com 2,45 milhões de unidades sobre os 2,23 milhões no mesmo período de 2017.
Exportações − O balanço mostra uma retração de 1,8% das exportações em outubro, com 38,7 mil unidades no mês em relação às 39,5 mil em setembro, e de 37,3% sobre as 61,8 mil unidades exportadas em outubro de 2017. Nos dez meses já transcorridos de 2018, a redução foi de 10,9%, com 563,0 mil veículos este ano e 631,8 mil no ano passado.
Caminhões e ônibus − No segmento de caminhões, as vendas atingiram 7,9 mil unidades, volume 17,7% superior às 6,7 mil unidades vendidas no mês anterior e 57% também superior às 5,0 mil unidades vendidas em setembro de 2017. O acumulado aponta um crescimento de 50,2%, com 60,7 mil unidades até outubro contra as 40,4 mil do ano passado. A produção no segmento ficou em 10,9 mil unidades em outubro, o que representa acréscimo de 19,1% se comparado com as 9,1 mil de setembro e de 31,8% frente as 8,2 mil de outubro do ano passado. No acumulado do ano, com 88,1 mil unidades, a elevação é de 30,6% sobre as 67,4 unidades produzidas no mesmo período de 2017.
Máquinas agrícolas e rodoviárias − As vendas internas de máquinas agrícolas e rodoviárias atingiram 5,0 mil unidades em outubro, volume 2,6% superior às 4,9 mil de vendidas em setembro e 35,3% sobre as 3,7 mil de outubro de 2017. No período de janeiro a outubro, as vendas de máquina cresceram 10,6%, com 39,6 mil unidades em 2018 e 35,8 mil em 2017. A produção terminou o mês com 7,4 mil máquinas em outubro, volume 28,9% superior às 5,8 mil produzidas em setembro e 72,1% sobre as 4,3 mil de outubro do passado. No acumulado do ano, foram produzidas 53,6 mil unidades, o que significou um aumento de 14,9% sobre as 46,6 mil máquinas produzidas no mesmo período de 2017.
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Lenta recuperação na indústria de máquinas
O levantamento divulgado em outubro pela Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) indica que, no mês de setembro, a receita líquida totalizou R$ 7,09 bilhões, o que significou uma retração de 4,1% em relação ao mês imediatamente anterior, mas manteve a tendência de recuperação em relação ao ano passado, registrando um crescimento de 13,4% sobre o mês de setembro de 2017. O resultado acumulado nos nove primeiros meses do ano manteve a firme tendência de recuperação, totalizando R$ 57,63 bilhões, valor 7,4% ao do mesmo período de 2017. No entanto, com relação ao período pré-crise, quando a indústria de máquinas e equipamentos vendia, em média, R$ 11 bilhões por mês, ainda existe uma queda acumulada de 37%. A Abimaq estima que o último trimestre deste ano deverá ser de queda das vendas em relação ao terceiro trimestre, mais isso não deve impedir o setor de encerrar 2008 com um crescimento ao redor de 7% nas suas vendas em relação a 2017.
Exportações − As exportações de máquinas e equipamentos vêm registrando fortes oscilações nos últimos meses. No mês de setembro, após um crescimento de 43,5% no mês de agosto, as exportações registraram uma queda de 24,7% e de 9,4% em relação ao mês de setembro de 2017. Com este número, o crescimento acumulado em 2018 recuou um pouco e chegou a 10,9%, sendo que, até o mês de agosto, o setor acumulava um crescimento de 13,9%.
Os principais destinos das exportações brasileiras de máquinas e equipamentos foram, pela ordem, América Latina, Estados Unidos e Europa. As exportações para América Latina e Mercosul registraram uma redução da ordem de 5,4% e 9,3% respectivamente, devido basicamente à redução das exportações à Argentina. No desempenho anual, a maior contribuição para o crescimento continua sendo do mercado norte-americano e dos países europeus, que ampliaram suas compras no Brasil em 50,6% e 30,8%, respectivamente, no período de janeiro a setembro deste ano em relação ao mesmo período de 2017.
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Construção civil anda de lado
Em tempos de crise, ‘andar de lado’ é um resultado a se comemorar, já que a alternativa seria ‘andar para trás’. A consagrada expressão, colhida do modo de andar dos caranguejos e outros crustáceos, define bem o desempenho recente da construção civil, duramente atingida pela recessão generalizada que vem afetando a economia desde 2014. Grande mercado de aço e criadora de empregos, a construção civil, pelo seu efeito multiplicador, é um setor-chave em qualquer plano de recuperação da economia. A questão, porém, é como dar o ponta-pé inicial desse processo − e as entidades representativas do setor têm-se mobilizado nesse sentido.
No dia 31 de outubro, o deputado Onyx Lorenzoni, futuro chefe da Casa Civil, recebeu da indústria da construção um documento com sugestões para ações imediatas para uma rápida retomada da geração de empregos e o consequente reaquecimento da economia. Se forem realizadas, as medidas propostas têm o potencial de criar 1 milhão de empregos já no primeiro ano do novo governo. Entregue durante a reunião do Conselho de Administração da Câmara Brasileira da Indústria da Construção Civil (CBIC), e com a presença de entidades da Coalizão pela Construção e de outros setores industriais, o documento trata da retomada de obras paralisadas, da melhoria nas condições do crédito imobiliário, da execução de um programa de concessões municipais e da aceleração do licenciamento ambiental. Um levantamento da entidade mostra que de 3 mil obras paradas no país, 671 estão em condições de ser retomadas com uma simples assinatura de contrato, por meio de empréstimos do FGTS às prefeituras.
O setor de construção civil está apostando na retomada do emprego como uma primeira ação importante e necessária do novo governo. “Acreditamos piamente que o nosso setor tem grande contribuição para isso. E também acreditamos no que está sendo proposto: que prevaleçam a livre iniciativa, a transparência e a competência. Combina com nossos paradigmas”, disse o presidente da CBIC, José Carlos Martins. Onyx Lorenzoni respondeu mencionando que o novo governo será pautado por novas relações com o setor privado. “Temos a chance rara de refundar o Brasil com os princípios e valores que norteiam a relação entre o setor público e o setor privado.”
Além do presidente da CBIC, estiveram presentes ao encontro dirigentes do Instituto Aço Brasil (IABr), do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada (Sinicon), da Associação Brasileira da Indústria de Equipamentos (Abimaq), Associação Brasileira da Indústria Téxtil e de Confecção (Abit), Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).