HORA DE TORCER PELO BRASIL

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HORA DE TORCER PELO BRASIL

HORA DE TORCER PELO BRASILOs indicadores econômicos registrados nos últimos meses ainda estão longe de sinalizar o fim da recessão, mas já permitem acreditar que ‘o pior já passou’

Nem tudo vai mal no Brasil: em sua sétima vitória consecutiva, a seleção de futebol goleou a do Uruguai por 4 a 1 e praticamente garantiu sua vaga na próxima Copa do Mundo. O ótimo desempenho da seleção, porém, tem sido apenas um paliativo para a angústia provocada pela recessão que já se arrasta há três anos. Ao contrário do futebol, a economia teima em andar de lado e só agora começa a dar tímidos sinais de recuperação. Alguns indicadores, como índice de inflação, juros e de confiança, têm se mostrado positivos nos últimos meses, mas ainda estão longe de despertar entusiasmo. O sinal mais alvissareiro surgiu em fevereiro, quando a contratação de trabalhadores com carteira assinada superou o número de demissões, pela primeira vez desde março de 2015, segundo. Os 35.612 trabalhadores contabilizados pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) estão muito aquém dos mais de 13 milhões de desempregados, mas não deixam de ser um sinal positivo.

HORA DE TORCER PELO BRASILSe no futebol tudo se resolve com 23 jogadores competentes, comandados por um técnico excepcional, a economia é um ‘esporte’ muito mais complexo, cujo desempenho depende da coesão entre uma infindável quantidade de fatores e interesses, que precisam ser coordenados com extrema habilidade política. E, neste último quesito, ainda não apareceu nenhum ‘técnico’ à altura de Tite. Assim, para os milhões de empresários e trabalhadores brasileiros, o panorama econômico tem mais promessas do que certezas. Por enquanto, só lhes resta continuar torcendo para que os indicadores econômicos reflitam vitórias mais palpáveis sobre a recessão.

Andando de lado

HORA DE TORCER PELO BRASILDentre os principais indicadores, a evolução do PIB – a soma de todos os bens e serviços produzidos no país – é o que reflete de forma mais direta o estado de saúde da economia. O exemplo mais emblemático tem sido o crescimento do PIB chinês, num ritmo de duas casas percentuais por ano, nas últimas décadas, alavancando esse país à condição de segunda potência econômica mundial. O PIB do Brasil nunca chegou perto disso, mas vinha crescendo com índices positivos que oscilaram entre 0,4%, em 1996, e 7,6%, em 2010. O único ponto fora da curva foi uma queda 0,2%, em 2009, refletindo a crise internacional que começou no ano anterior.

A recessão veio com toda força a partir de 2014, com um aumento insignificante de 0,1%, que evoluiu para uma queda abrupta de 3,8% em 2015. Em 2016, essa queda manteve seu impulso, registrando uma nova redução de 3,6%. Em janeiro, tanto FMI quanto o Banco Central previram uma leve recuperação de 0,5% este ano, seguida de 1,8%, em 2018. Essa previsão tem sido confirmada por especialistas do mercado financeiro, que em março estimaram uma evolução de 0,48% para 0,49% –, ou seja, uma previsão próxima à anterior, só que com duas casas após a vírgula. Seja como for, depois de 7,4% negativos – apenas somando os percentuais de 2015 e 2016 –, uma recuperação de meio ponto percentual é pouco, muito pouco, mas pelo menos passou do vermelho ao azul.

Medida pelo Índice de Preços ao Consumidor – Amplo (IPCA), a inflação também tem sido um dos vilões da economia, teimando em superar desde 2008 o patamar de 4,5% estabelecido como aceitável pelo Banco Central. Em 2009, até deu um alívio, caindo para 4,31%, mas daí em diante foi ficando fora de controle até atingir preocupantes 10,67% em 2010. No ano passado, caiu para 6,29% e, na última semana de março, o a previsão do BC já tinha caído para 3,9%, graças principalmente à redução dos preços dos alimentos. Vale lembrar que, no Brasil, o combate à inflação provoca duas medidas polêmicas: a manutenção da taxa Selic num patamar elevado e a política cambial, supostamente flutuante, mas que sofre constantes interferências do BC, para total desgosto dos setores exportadores.

Com PIB e inflação fora do vermelho intenso, o Comitê de Política Monetária (Copom) houve por bem determinar pequenas reduções na taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia, mais conhecida como Selic, que define a remuneração dos títulos públicos. Utilizada para controlar a inflação, essa remuneração, tida como ‘estratosférica’ em comparação com suas congêneres de outros países, acaba inibindo os investimentos e atraindo capitais especulativos ao País. Depois de um período em baixa, na casa dos dois dígitos, em 2012 e 2013, voltou a subir até atingir obscenos 14,25% entre julho de 2015 e agosto de 2016. De lá para cá, foi sendo paulatinamente reduzida até atingir o patamar atual de 12,25%. Acreditam os agentes do mercado financeiro que, com o PIB em recuperação e a inflação sob controle, haverá condições para que ela chegue a 9,75% até o final deste ano.

HORA DE TORCER PELO BRASILResumindo, se tudo ocorrer como planejado, em dezembro de 2017, o PIB terá crescido 0,5%, a inflação deverá ser de, no máximo, 4,5% e a taxa Selic, de 9,75%, criando condições para que a economia brasileira, aí sim, comece 2018 com o pé direito, tendo recuperado a confiança dos empresários, que, por sua vez, deverão voltar a investir e, consequentemente, reduzir o desemprego a um patamar civilizado.

Mercado em recuperação

Taxas, índices e indicadores são apenas o lado técnico da economia. O lado real e perverso chama-se desemprego, aquela situação inesperada que deixa o trabalhador ‘sem chão’. Da mesma forma, a recessão também deixa o empresário ‘sem chão’. Assim como o bom empresário detesta demitir, ele detesta mais ainda falir. Todo esse processo indesejado está implícito nos números de cada segmento da economia.

Os dados coletados pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) ilustram bem o impacto da recessão no mercado automotivo, que se contraiu 20,2%. O volume de veículos novos licenciados, nacionais e importados, caiu de 2.568.976, em 2015, para 2.050.317, em 2016. Para a indústria nacional, essa redução do mercado significou uma queda de 11,2% em sua produção anual, que caiu de 2.429.421, em 2015, para 2.157.379, em 2016. O único indicador positivo do setor foi o das exportações, que evoluíram 1,6%, em valor. Com os pátios lotados e menos produção, não houve como evitar as demissões, que reduziram em 7,1% o contingente de operários empregados do setor.

No entanto, 2017 já mostrou uma tendência de recuperação de alguns desses índices. No primeiro bimestre, o licenciamento de veículos novos manteve sua tendência de queda, mas tanto as vendas de máquinas agrícolas e rodoviárias quanto as exportações tiveram fortes recuperações em relação ao mesmo período do 2016: 49,9% e 73,1%, respectivamente. A produção nacional de autoveículos também cresceu 28,1%, refletindo a confiança do setor na recuperação do mercado, que prevê ampliar sua produção anual em 11,9% e as exportações em 7,2%. Outro sinal positivo tem sido o nível de emprego, que, embora tenha caído 6,8% entre fevereiro de 2016 e fevereiro de 2017, voltou a crescer 0,3% entre janeiro e fevereiro deste ano.

Aposta nas exportações

HORA DE TORCER PELO BRASILComo não poderia deixar de ser, a queda do PIB não poupou a demanda interna de aço. Em dezembro de 2016, a previsão do Instituto Aço Brasil (IABr) era de uma redução de 7,6% na produção anual de aço bruto sobre o ano de 2015, totalizando 30,7 milhões de toneladas. Da mesma forma, as vendas internas de produtos siderúrgicos teriam uma retração de 10,1%, atingindo a 16,3 milhões de toneladas, e o consumo aparente deveria totalizar 17,9 milhões de toneladas, o que representa uma redução de 16,2% sobre o ano anterior. Ainda segundo a entidade, esses resultados significam um retorno aos padrões de 2009.

Por outro lado, as expectativas quanto ao desempenho do setor em 2017 eram positivas, prevendo um crescimento de 3,5% no consumo aparente e de 3,6% nas vendas internas. “A intensidade das quedas no desempenho dos indicadores da indústria brasileira do aço vem diminuindo, o que permite dizer que o pior talvez já tenha passado”, avalia o IABr na última edição de seu informativo em 2016. “Mas esse novo quadro não garante a recuperação vigorosa do setor num cenário ainda difícil devido à manutenção da convergência de fatores estruturais e conjunturais. Com o mercado interno ainda muito enfraquecido, o único caminho para o crescimento no curto prazo é a exportação. Para isso precisamos de isonomia competitiva, proporcionada pela compensação dos tributos não recuperáveis das exportações e redução dos custos de financiamento que elevam o custo Brasil.”

Segundo o IABr, a falta de competitividade da indústria brasileira do aço também tem sido responsável pela queda de 0,2% nas exportações em 2016. Além das assimetrias internas, outro fator a ser considerado é excesso de capacidade de produção de aço no mercado mundial. “Dos 780 milhões de toneladas de excedente de capacidade instalada de aço no mundo, mais de 400 milhões de toneladas estão na China. A concorrência é injusta, pois se dá com empresas que recebem fortes subsídios do governo desse país. As exportações chinesas de aço que, em 2015, atingiram mais de 110 milhões de toneladas, encontram-se, neste ano, num ritmo de 115 milhões de toneladas. Em 2000, a China participava com 1,3% das importações diretas de aço para o Brasil. Em 2015, atingiu 50,2%. É contra esta concorrência predatória que os governos de vários países estão lutando com diferentes medidas de defesa comercial. No Brasil não deveria ser diferente, sob pena de agravamento da situação da indústria”, afirma o boletim do IABr.

De olho nos mercados

HORA DE TORCER PELO BRASILNo Instituto Nacional dos Distribuidores de Aço (Inda), os resultados referentes ao mês de fevereiro registraram uma queda de 11,1% nas compras sobre janeiro, com volume total de 222,2 mil toneladas. Frente a fevereiro do ano passado, quando as compras atingiram 224,9 mil toneladas, a queda foi de 1,2%. As vendas de aços planos contabilizaram uma queda de 9,8% sobre janeiro, atingindo o montante de 215,5 mil toneladas contra 239,0 mil toneladas. Sobre fevereiro do ano passado, quando foram vendidas 242,9 mil toneladas, registraram uma queda de 11,3%. Os estoques de fevereiro sofreram alta de 0,7% em relação ao mês anterior, atingindo 918,3 mil toneladas, sendo que o seu giro se ampliou para 4,3 meses, ou seja, acima do giro ideal, próximo a 3 meses. As importações encerraram o mês de fevereiro com queda de 52,4% em relação ao mês anterior, com volume total de 59,4 mil toneladas. Comparando-se ao mesmo mês do ano anterior, quando foram importadas 24,3 mil toneladas, registraram alta de 144,3%.

A expectativa da rede associada ao Inda para o mês de março é de que tanto as compras quanto as vendas cresçam aproximadamente 25,0%. “Nós trabalhamos em cima das expectativas dos nossos principais mercados, como o setor automotivo e o de máquinas e equipamentos. Neste setor, por exemplo, as vendas para o mercado interno têm caído, mas as exportações cresceram e, para nós, o que interessa é a produção, não só para o mercado interno”, explica o presidente executivo do Inda, Carlos Jorge Loureiro. “O setor automotivo também trabalha com a expectativa de crescer em torno de 11% por causa do aumento das exportações. Deve crescer 2% ou 3% no mercado interno, mas 30% ou 40% na exportação. A venda de aços planos por nosso setor corresponde a 35% do crescimento das vendas do setor automotivo. Então só com o aumento de 11% nesse setor, nossas vendas devem crescer 3,5%. No setor de máquinas e equipamentos, embora as vendas globais tenham caído, o segmento de máquinas agrícolas, que corresponde a algo entre 8% e 10% do total da Abimaq, está indo muito bem e estima crescer 20% este ano. Se essas duas previsões se concretizarem, nossa rede teria um crescimento em torno de 5% em suas vendas. Por enquanto temos trabalhado com esses números, que só vão ser revistos em maio, quando os números de abril estiverem consolidados”.

Sobre suas expectativas em relação ao desempenho do governo, Loureiro afirma estar surpreso com os resultados alcançados até o presente momento. “Dentro das condições existentes, acho que o governo está conseguindo resultados acima do esperado. Por exemplo, todo mundo estava prevendo que a inflação continuaria muito acima do teto fixado pelo governo, que é de 4,5%, e hoje está próximo disso. Ou seja, pelo menos na área monetária o governo está tendo resultados muito bons. E na área política, com toda essa confusão que está ocorrendo, conseguir passar uma reforma da Previdência – ainda que com algumas concessões em relação à proposta inicial – já é muito bom. Em função da situação política, eu acho que o que está se conseguindo na área econômica não é ideal, mas está acima, particularmente, da minha expectativa. A única restrição que nós temos é deixar o dólar correr do jeito que está correndo. Isso é algo que ainda vai custar caro lá na frente”, completa Loureiro.

Investimentos imprevisíveis

Neste momento é de incertezas, as projeções da indústria de máquinas e equipamentos seriam uma forma de preverá quantas anda a disposição dos empresários para investir. Representado pela Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), o setor tem contabilizado sistemáticas reduções em seus indicadores de desempenho, nos últimos anos. O consumo aparente de máquinas e equipamentos no Brasil caiu 22,4% só no acumulado entre os primeiros de 2016 e 2017. Da mesma forma, a receita líquida do setor também caiu 10,1% nesse período, bem como as exportações, que caíram, 3,6%, provavelmente devido à redução do grau de competividade dos produtos brasileiros devido à valorização do real frente ao dólar – queixa recorrente em todos os setores exportadores. Entre todos os números consolidados pela Abimaq, cabe destacar a evolução – ou, mais precisamente, regressão – do pessoal ocupado pelo setor, que atingiu seu pico em 2011, com 386 mil funcionários, mas caiu para uma média de 292 mil no último bimestre – uma assustadora redução de 25% em cinco anos!

Entre os levantamentos estatísticos divulgados mensalmente pela Abimaq não constam, porém, as previsões de vendas para este ano e para os próximos anos. Não se trata de um descuido da entidade, mas de uma característica intrínseca do setor, como explica o seu diretor de Competividade, Mario Bernardini. “Eu acho difícil fazer uma previsão plurianual no Brasil. Os budgets que os empresários fazem se baseia outras premissas, evidentemente. Mas o investimento– que é o que nós, da Abimaq ‘vendemos’ – depende de alguns fatores. Para investir, é preciso ter um cenário de crescimento e, além disso, uma previsão de rentabilidade nas vendas. Nestas condições, as empresas compram máquinas. E neste momento, nós não temos nenhuma dessas duas premissas, o que nos impossibilita de fazer previsões”, explica Bernardini. “O crescimento do PIB previsto para este ano é de 0,5%. Ora, depois de 50% de queda, 0,5% de crescimento é mais ou menos nada! Se olharmos as previsões da Focus e do mercado financeiro especificamente para a formação bruta de capital fixo, ou seja, para os investimentos deste ano, as previsões variam entre 0% e 0,2%. Portanto, apesar do início das concessões, não há previsão de crescimento dos investimentos este ano. Quem faz planejamento a longo prazo pode dizer que o ano de 2017 está parado, mas que em 2018 e 2019 vai crescer e precisa se preparar para isso. Acontece que a média das previsões de crescimento em 2018 é de 1,5% – e isso sobre um PIB já que caiu cerca de 10%. Ou seja, de 90, o PIB cresceria para 91 ou 91,5”, avalia Bernardini. “Neste quadro, falar em previsão de investimento é extremamente arriscado. Ainda mais porque o governo está obcecado em fazer o ajuste fiscal, que vai depender do tipo de reforma da Previdência que vai passar pelo Congresso. Se essa reforma não fechar as contas, ou seja, não sinalizar que a dívida pública vai se estabilizar, nada muda! Volta a crescer o ‘risco País’ e a instabilidade, e o apoio ao governo Temer, que se baseia num compromisso de sucesso, vai começar a se diluir – e nós vamos ter problemas”.

Estabelecida a possibilidade de se delinear esse quadro, Mario Bernardini não se arrisca a fazer previsões. “Para 2017, nós não estamos pensando em crescimento real, talvez ocorra um crescimento nominal. Não podemos esquecer que em 2016, a receita do nosso setor caiu quase 20% sobre 2015. Portanto, este ano, é possível que ocorra um crescimento nominal entre 3% e 5%, mas isso significa um crescimento real igual a zero, considerando a inflação prevista. Podemos dizer, então, que nossa previsão é de manutenção dos níveis de faturamento atuais, com pequenas variações para cima e para baixo. Tal como todo mundo e o próprio governo, estamos torcendo para que sejam antecipadas algumas medidas, as quais que possam incentivar o crescimento, como câmbio, retorno do crédito e forte redução dos spreads bancários. Há uma série de medidas que podem ser tocadas pelo governo simultaneamente com o ajuste e que não o prejudicariam – ao contrário, podem até ajudá-lo. Elas permitiriam um crescimento mais robusto do País e, portanto, um aumento da arrecadação, que é a única forma de fechar as contas”, completa o diretor de Competividade da Abimaq.