sábado, outubro 26, 2024
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Mercado globalizado, mas nem tanto

A indústria siderúrgica nacional não foge à regra mundial de ampliar as exportações para compensar a redução do mercado doméstico e de tentar reduzir a concorrência do aço importado

Quando o mercado doméstico anda em baixa, a solução é exportar. Essa solução pode valer para produtos manufaturados, destinados a mercados específicos. Já no caso das commodities, cuja demanda tem andado retraída nos últimos anos, essa solução é um tanto mais complexa. Principalmente, quando se trata de uma commodity mais elaborada, cuja produção implica enormes investimentos, planejamento e retorno no longo prazo, como o aço. Esse tem sido o desafio que a siderurgia nacional tem enfrentado nos últimos anos: como aumentar as exportações – e reduzir as importações – num mercado de concorrência tão acirrada.

Segundo a World Steel Association (Worldsteel), associação que reúne as principais fabricantes de aço do mundo, este ano a demanda mundial de aço deve ter um incremento de 7%, atingindo 1,62 bilhão de toneladas. Para 2018, a expectativa é de que ocorra um novo aumento, de 1,6%, totalizando 1,65 bilhão de toneladas. Na América Latina, estima-se uma elevação de 2,5% este ano, para 40,4 milhões de toneladas, e de 4,7% em 2018, para 42,3 milhões de toneladas. Esses números indicam uma tendência à recuperação do mercado. O problema, porém, é que o índice de utilização da capacidade de produção mundial é de 73% – ou seja, 13% inferior aos 86% registrados em 2006. O ‘fundo do poço’ ocorreu em 2008, quando foi inferior a 70%. Hoje, passados nove anos, encontra-se ainda muito abaixo do que já foi 11 anos atrás.

Nesse ambiente nada amigável para as siderúrgicas – sejam elas brasileiras, chinesas ou americanas –, o que mais tem se assistido são denúncias de dumping e ações de antidumping. Estima-se que há 185 processos de antidumping vigentes e 93 em análise em todo o mundo, refletindo a tentativa generalizada das indústrias siderúrgicas de cada país de blindar seus mercados domésticos.

Exportações em queda

Mercado globalizado, mas nem tantoSegundo o levantamento mensal feito pelo Instituto Aço Brasil, a produção nacional de aço bruto acumulada de janeiro até setembro de 2017 foi de 25,5 milhões de toneladas, o que equivale a uma elevação de 9,1% quando comparada com o ocorrido no mesmo período de 2016. A produção de laminados foi de 16,6 milhões de toneladas no mesmo período, um incremento de 4,7% frente ao acumulado no mesmo período 2016. As vendas ao mercado interno somaram 12,6 milhões de toneladas, o que representou uma elevação de 0,2% em relação ao mesmo período acumulado de 2016. O consumo aparente nacional de produtos siderúrgicos (produção nacional, menos exportações e mais importações) foi de 14,4 milhões de toneladas, evoluindo 5,0% sobre o mesmo período de 2016.

No que se refere ao comércio exterior, na comparação entre o mesmo período, janeiro a setembro de 2017 sobre 2016, as importações do setor cresceram 56,8%, totalizando 1,8 milhão de toneladas e US$ 1,7 bilhão, uma alta de 44,4% em valor. As exportações foram de 11,0 milhões de toneladas e US$ 5,6, o que significou uma expansão de 9,3% em volume e de 36,0% em valor frente ao mesmo período de 2016. O Instituto Aço Brasil ressalva, porém, que os indicadores de produção e exportação no acumulado do ano de 2017 foram impactados positivamente pelo fato de a Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP) ter iniciado suas operações somente no segundo semestre de 2016. Por isso, a inexistência de dados da CSP no primeiro semestre de 2016 mantém a base de comparação baixa ao comparar com o período de 2017, criando distorções que deverão desaparecer somente a partir de janeiro de 2018. Excluindo, a CSP da base de comparação do acumulado de janeiro a setembro de 2017 frente ao mesmo período do ano anterior, a produção de aço bruto não cresceu 9,1%, mas apenas 3,5%. E o volume das exportações, ao invés de crescer 9,3%, recuou 8,1%.

Vale lembrar, porém, que, embora este ano as exportações de aço mostrem leves sinais de recuperação, no ano passado, as usinas nacionais exportaram 12,5 milhões de toneladas de aço, volume 6,7% menor do que em 2015. No Congresso Aço Brasil 2017, realizado nos dias 22 e 23 de agosto, em Brasília, os panelistas e debatedores concluíram que “a recuperação do mercado interno será lenta, gradual e heterogênea, estimando que as vendas domésticas de produtos siderúrgicos só voltarão aos níveis de 2013 quinze anos depois, ou seja, em 2028. As exportações continuam sendo a opção de curto prazo para evitar que as empresas reduzam ainda mais o nível de utilização de sua capacidade, atualmente já no patamar de 63%, o mais baixo de sua história. Consequentemente, as exportações continuam sendo a opção de curto prazo para evitar que as empresas reduzam ainda mais o nível de utilização de suacapacidade, conforme divulgado na edição de setembro do boletim Aço Brasil Informa.

Coalizão anti-antidumping

Mercado globalizado, mas nem tantoEmbora as exportações de aço brasileiro sejam ainda muito superiores às importações, estas têm crescido muito mais intensamente do que aquelas – 44,4% contra 9,3%, em setembro deste ano –, induzindo as siderúrgicas nacionais a observar com mais cuidado os sinais da prática de dumping pelas indústrias siderúrgicas de outros países, especialmente da China. Atendendo a uma solicitação das siderúrgicas, em 2016, o Departamento de Defesa Comercial (Decom), autoridade investigadora brasileira para fins de defesa comercial, vinculado à Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), começou a investigar um possível dumping no aço laminado a quente proveniente da Rússia e China. Não demorou, porém, para essa ação ser contestada por outros setores industriais do País, os quais alegam que a aplicação de tal medida poderá provocar aumentos nos seus custos de produção, além de prováveis retaliações comerciais por parte dos países acusados de praticar dumping.

Essa contestação tem sido feita por uma coalizão de entidades, coordenada pela Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), que começou cm 17, mas hoje congrega 26 associações dos mais variados segmentos industriais, as quais alegam que, caso esse antidumping seja concedido, seu potencial de destruição será muito grande. “O aço em questão – chapas, bobinadas ou não, laminadas a quente, com espessura até 4,7 mm –, é largamente utilizado pelas indústrias de máquinas-ferramenta, máquinas rodoviárias, máquinas para embalagem e, principalmente, máquinas agrícolas”, explica o presidente executivo da Abimaq, José Velloso. “No Brasil, nós temos, hoje, aproximadamente 24 ações antidumping relativas ao aço. Não tão importantes como essa, porque ela se refere a um aço largamente utilizado e seria muito prejudicial para a indústria de máquinas, porque, com certeza, haveria aumento de preços e, com isso, aumento dos custos dos investimentos no País. Mas também aumentariam os custos da linha branca, dos bens de consumo duráveis, dos automóveis – já que aumentaria o custo das autopeças –, bem como das estruturas metálicas utilizadas na construção civil. Em suma, haveria um aumento generalizado dos custos nas cadeias produtivas da indústria de transformação como um todo”, adverte Velloso.

Há, portanto, um longo e espinhoso caminho a ser percorrido para conciliar tantos interesses, internos e externos, num ambiente internacional de concorrência selvagem, que tende a favorecer os ‘predadores’ mais fortes. No Brasil, o desafio é manter um índice mínimo de ocupação da capacidade de produção instalada das usinas siderúrgicas, sem que as ações nesse sentido representem aumentos nos custos de produção de outros setores industriais.

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